Os manifestantes que protestaram nesta sexta-feira na porta do
Palácio Tiradentes erraram de endereço. O lugar certo era a sede do STF,
na Praça dos Três Poderes, em Brasília. O que aconteceu na Assembléia
Legislativa do Rio de Janeiro tornou-se pedra cantada desde que o STF,
há exatamente um mês, concedeu ao Poder Legislativo a prerrogativa de
rejeitar medidas cautelares impostas a seus membros. A medida, feita de
encomenda para que o Senado livrasse o senador Aécio Neves do
afastamento do mandato e do recolhimento domiciliar noturno, hoje
permitiu que três notáveis integrantes da organização criminosa que atua
no Rio fossem mantidos em seus cargos: Jorge Piciani, que continuará
presidindo a Alerj, e os deputados Paulo Melo e Edson Albertassi.
Presos, eles poderiam ter tido a prisão desautorizada pela Alerj, como
prevê a Constituição. Mas o afastamento de cada um deles do mandato só
foi possível por conta da recente decisão do STF. Se ela não for
revista, daqui para a frente será impossível investigar e punir
ocupantes de cargos legislativos. Mais bandidos vão se empenhar na
conquista de um mandato.
O episódio foi vergonhoso para os membros da Alerj em todos os
detalhes: votação secreta, rito sumário e relâmpago e, do lado de fora,
muita bala de borracha disparada pela polícia do governador Pezão contra
os manifestantes. Pezão era diretamente interessado na reversão da
punição aos aliados. Ele chegou a indicar Albertassi para o Tribunal de
Contas do Estado, onde precisa desesperadamente de aliados no julgamento
de ações que envolvem seu governo e o de Sérgio Cabral.
O caso da Alerj é o mais notável, depois da decisão que beneficiou
Aécio, porque envolve um dos homens mais poderosos da política do Rio,
mas não é o único. Picciani, ao tornar-se cacique poderoso do PMDB do
Rio, estendeu sua influência ao governo federal, nomeando seu filho
Leonardo como ministro do Esporte e indicado aliados para o segundo
escalão . Mas ele é, sobretudo, um “capo” da máfia fluminense, que
extrai propinas de empresas que atuam como fornecedoras ou
concessionárias do Estado. Os que andam de ônibus no Rio pagam um
“pedágio” para estas propinas, embutido na tarifa elevada. Tudo isso faz
do acontecido na Alerj algo estarrecedor, fortalecendo a convicção
popular de que a impunidade continuará beneficiando os políticos. Há
notícias, porém, de que no país inteiro têm ocorrido episódios
semelhantes, em que as câmaras de vereadores, principalmente,
desautorizam medidas contra seus integrantes. O STF deu a senha, o
Senado deu o exemplo e os outros estão seguindo.
Picciani, de todo modo, viveu seu canto do cisne, deu sua última
grande demonstração de poder na Alerj. O PMDB do Rio está em vias de
extinção: Cunha preso, Cabral preso, Pezão e Eduardo Paes crivados de
denúncia e Picciani no corredor da morte. Se há um estado onde a
renovação política deve ser vigorosa é o Rio.
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