Caríssimo Prof. Vinicius Bonifácio, Goiânia, GO.
Um@ profess@r vive grandes e transcendentais alegrias, apesar dos
maus tratos causados pelos baixos salários, pelo desprezo de chefes de
instituições, que comercializam o ensino, e pela preguiça de alun@s mutilad@s pela alienação burguesa.
Outro dia, numa linda festa de aniversário, mencionaram o teu nome e a
alusão de minha pessoa nos embates com a ditadura, que fizeste a um
grupo de teus/tuas alun@s, me fez muito alegre e agradecido a ti.
Foste meu aluno de pós-graduação de um módulo "história da educação".
Hoje lecionas história da educação. Teu desenvolvimento intelectual em
plena comunhão com um compromisso social avançado só me fazem agradecido
pelo que és. Ao fazeres mestrado numa universidade pública federal e ao
lecionares noutra pública estadual mostras o que valoriza um@ educador@
séri@ e comprometid@ com a educação, como valorização do ser humano e
seus potenciais éticos e políticos. Parabéns, meu irmão negro
brasileiro.
Neste texto me proponho refletir sobre a coragem de Lula.
Por mencionar coragem me vem à mente um maravilhoso livro de minha
juventude. Trata-se do "Coragem de Ser" do teólogo e vigoroso pensador
Paul Tillich, publicado aqui no Brasil pela Editora Terra.
Coragem de Ser é produto de uma série de conferências feita por
Tillich na Yale University, nos Estados Unidos. Portanto, é obra filha
de rigorosa pesquisa e preparação de um professor comprometido
eticamente com o conhecimento.
O autor investiga a palavra coragem desde os radicais gregos,
latinos, franceses, ingleses e alemães, percorrendo os filósofos
clássicos para definir os significados da coragem nas várias gerações e
culturas.
Aqui importa-me a "coragem" que o autor relaciona como virtude ao lado da sabedoria, da temperança e da justiça.
Melhor, Tillich afirma que a coragem nos filósofos gregos é virtude subordinada à sabedoria.
A coragem é realização da nobreza ética do ser humano. Nobreza
traduzida do grego significa "belo" e "bem". Em contrapartida, a
covardia é feia e má.
Na linha idealista buscar o belo e o bem é tanger a transcendência ética ativa na divindade absoluta.
A coragem submersa na sabedoria é a superpotência humana de quem une o
centro da vida – chamado coração e alma, plenos de vontade e de
consciência – com a razão que a tudo fundamenta e explica. Ser corajos@
implica em conhecer a realidade e em viver o bem e a justiça, sendo b@m e bel@ nas ações e na luta pela justiça de tod@s.
Logo, creio que vivemos uma crise gigantesca entre a coragem e a covardia, hoje, no Brasil e no mundo.
De um lado @s corajos@s são agredid@s, difamad@s e desrespeitad@s e,
de outro, covardes agridem, difamam e desrespeitam com virulência e sem
razão, despidos de um mínimo de sabedoria.
Há figuras brasileiras, todavia, que honram nossa história por sua coragem e por todas as virtudes.
Numa entrevista à Jô Soares em 1988 Luiz Carlos Prestes disse que
apoiava Leonel de Moura Brizola como governador do Rio, independente do
partido dele aceitar ou não, porque aquele líder se notabilizou pela
coragem e pela honestidade.
O grande líder nunca roubou o patrimônio público, jamais se
aproveitou do poder para enriquecer. Sempre usou o poder para lutar pelo
povo. Não titubeou em denunciar as corporações e o imperialismo, como
monstro ameaçador de nossa soberania nacional.
Noutras palavras, o cavaleiro da esperança definia Brizola como líder
dotado das virtudes da coragem, da temperança – incansável no trabalho
pelo Estado –, da justiça – porque fazia da prática política meio para
lutar pelo povo -, e da sabedoria porque procurava se cercar de grandes
sábios como Darci Ribeiro, Abdias Nacimento, Oscar Niemeyer e outros.
Perguntado sobre Luiz Inácio Lula da Silva, em 1988 um grande líder
sindical e deputado federal constituinte, Luiz Carlos Prestes disse que
ele precisava estudar mais para entender a classe trabalhadora e a
revolução.
Dizendo de outra maneira, o líder revolucionário afirmou que Lula
carecia de sabedoria para ser corajoso, da razão edificada sobre os
grandes postulados científicos a respeito de política para entender para
onde e como deve caminhar a humanidade e sobre o poder a ser
conquistado para atender aos interesses nacionais da classe
trabalhadora.
Brizola, por sua vez, afirmou que Lula toca política de ouvido e que
era preciso estudar para compreender os meandros mais complexos e
desafiantes da luta pelo poder.
Claro, Prestes e Brizola não se referiam aos estudos academicistas
arrogantes e despojados da prática militante. Isso não serve para nada.
A vida andou e fizemos história. Lula foi presidente do Brasil por
duas legislaturas. Tornou-se o primeiro operário a ser chefe dessa
nação. Alçou-se como uma das maiores e mais populares lideranças
mundiais.
Mas será que Lula é corajoso no sentido da tese de Tillich?
É certo que Lula se transformou muito. Antes do poder fazia bravatas,
era divisionista, politicamente moralista e raso ideologicamente.
Durante e após a presidência tornou-se mais pragmático e mais capaz de
fazer alianças com setores mais ao centro e à direita do espectro
político, dentro e fora do seu PT.
A direita, contudo, o ataca em nome de falso combate à corrupção,
mas, no fundo, temerosa de que sua atuação abra espaços para a revolução
socialista. Setores de esquerda o condenam por ser demasiadamente
versátil e ceder à direita, ao mercado e por não fazer as reformas de
interesse nacional e dos trabalhadores.
Nos últimos eventos no contexto de crise e do fogo cruzado, Lula
demonstra entender que não sinalizar mais avanços, mas empoderamento dos
trabalhadores, mais estatização, menos mercado e mais estado, foi
errado.
Hoje o ex-presidente reconhece que não regularizar a lei dos médios
para submeter as comunicações aos interesses nacionais e populares, e
não a grupos oligárquicos, como acontece com as atitudes desagregadoras e
bestiais da Globo, da Veja, da Folha, do Estadão e de seus afluentes,
que empestam os ares democráticos, foi equivocado.
No discurso por ocasião da comemoração dos 36 anos do PT, no Rio de
Janeiro, na noite de 27 de fevereiro, o ex-presidente criticou
fortemente a Globo e a mídia em geral por seu mau caráter e por sua
disposição criminosa para mentir, caluniar e ferir de morte as imagens
das pessoas.
Lula reconheceu que o próprio judiciário é covarde porque tem medo
das manchetes contrárias da mídia. Judiciário e mídia atuam covardemente
– no dizer de Tillich, sem sabedoria e sem senso do bem e do belo – em
julgamento sem júri, sem investigação e sem defesa. Os vereditos são
emitidos através de microfones de rádio, câmeras de TV, pelas páginas de
revistas e de jornais.
Nas redes sociais muitos elogiam Lula dizendo que antes tarde do que
nunca ele reconhece que a mídia age de modo psicopata e antissocial,
pisando nos direitos humanos, bases da democracia.
Demonstrando a coragem dos sábios, Lula, no seu discurso na noite de
27, disse: "Nem a morte apaga a vida do homem de verdade. Se você tem
uma causa, a causa fica pairando na cabeça de milhões de pessoas."
Em solidariedade ao ex-presidente o ministro-chefe da Casa Civil,
Jaques Wagner, disse: "O povo brasileiro pode ter certeza de que Lula
jamais se intimidará. Em vez de enfraquecê-lo, como esperam seus
adversários, os reiterados e injustos ataques dos quais tem sido vítima
nas últimas semanas só aumentam a vontade dele de continuar lutando por
um Brasil mais justo".
"Lula jamais se intimidará"!
Wagner supostamente sublinha as virtudes de coragem e sabedoria de Lula para a luta "por um Brasil mais justo".
Porém, até onde li e escutei do discurso de Lula não percebi coragem e
sabedoria suficientes para a autocrítica pelo erro de não fazer as
reformas que o País carecia.
Daí as tragédias da perda de amplos setores sociais para a direita
manipuladora e mentirosa, que conta com a mídia, com o judiciário, com a
polícia federal, com a oposição esfacelada, antinacional e corrupta e
com um Congresso Nacional pornográfico politicamente, dirigido por
mafiosos e covardes.
Lula é o brasileiro mais desafiado à coragem e à sabedoria. Seu
discurso e sua prática carecem ser afinados com os anseios mais
profundos de justiça social contra as oligarquias colonizadas,
parasitárias e pusilânimes.
Se pensa em se candidatar a presidente em 2018, Lula precisa desde
agora construir uma plataforma de governo que inclua amplos setores da
classe trabalhadora, do empresariado nacional, dos movimentos sociais e
dos pobres ainda excluídos. Tudo isso precisa indicar o tom de reformas,
não as neoliberais que os Cunha e Renan da vida querem, todas para
destruir os direitos sociais.
Lula carrega em sua mão esquerda a marca das injustiças que o capital
impõe aos trabalhadores. A falta de seu dedo mindinho causada por
"acidente" de trabalho e dos deboches que a direita faz vira símbolo do
desprezo ao povo e aos pobres.
Cada vez que a burguesia fascista vê aquela mão sem o dedinho sente
ódio e pena de que todo o seu dono não tenha sido extirpado pela máquina
triturante. Porém, cada vez que o povo brasileiro vê a falta daquele
dedo sente a dor da injustiça e o apelo para a coragem de mudar essas
relações injustas.
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