O governo Temer, que hoje tem como única prioridade garantir a
própria sobrevivência, cruzou uma fronteira perigosa na semana passada.
Se antes já tinha sua legitimidade contestada, por ter conquistado o
poder por meio de um impeachment sem crime de responsabilidade, agora
deixou claro que perdeu qualquer pudor e nem se preocupa mais manter as
aparências, ao retaliar ostensivamente as empresas do grupo do J&F,
da família Batista.
De um lado, a Caixa Econômica Federal antecipou os vencimentos de
empréstimos concedidos à JBS e à Flora, duas empresas do grupo J&F,
sem maiores explicações. Um tiro no pé, uma vez que o próprio banco é
acionista da companhia, que terá suas condições de liquidez afetadas, e
pode vir a ser acionado por eventual quebra de contrato. De outro, a
Petrobras também cortou repentinamente o fornecimento de gás para uma
usina termelétrica da J&F, prejudicando o próprio abastecimento do
setor elétrico nacional.
A Petrobras alega que a J&F feriu cláusulas anticorrupção, mas o
fato é que, aos olhos do Poder Judiciário, que concedeu os benefícios da
delação premiada aos irmãos Batista, eles são colaboradores da Justiça –
e não seus inimigos. Especialmente porque delataram esquemas de
corrupção e caixa dois que atingem não apenas Michel Temer, mas
políticos de todos os partidos. E a própria Petrobras fatalmente será
acionada na Justiça pela quebra de contrato.
Se isso não bastasse, foram também mobilizados outros órgãos
federais, como a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e o Conselho
Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) para encontrar eventuais
formas de prejudicar ainda mais o grupo empresarial que é hoje o maior
empregador do Brasil, com mais de 200 mil assalariados, em empresas como
JBS, Alpargatas, Flora, Vigor e Banco Original. Um atitude, no mínimo,
temerária, num país que já tem quase 14 milhões de desempregados.
Utilizar o estado em benefício próprio e como instrumento de vingança
contra adversários, que até ontem eram aliados, capazes até de
emprestar aviões particulares com direito a buquês de flores, é um
evidente atentado à democracia. Mas democracia é uma palavra que, há
muito tempo, deixou de ter significado no Brasil. Ainda assim, até
recentemente havia uma preocupação mínima em manter as aparências.
Agora, não mais.
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