Antes da sentença de Sérgio Moro contra Lula completar uma semana, a
elite brasileira já exibe a clássica postura de urubu que enxerga uma
providencial carniça na campanha de 2018 a candidatura Lula, o
adversário histórico, o único nome capaz de derrotar seus candidatos,
conforme todas as pesquisas eleitorais.
Sem dar-se ao trabalho de disfarçar a pressa, o economista Eduardo
Gianetti da Fonseca, personagem de relevo no círculo que retirou Marina
Silva do universo das lutas populares de origem para transformá-la em
atração nos salões da oligarquia financeira, diz na Folha de S. Paulo
que o TRF-4, que irá julgar os recursos de Lula, não deve perder tempo
para tomar uma decisão.
"Espero que os magistrados tenham o bom senso cívico de que não é
possível protelar esse julgamento," diz o economista. Embora declare uma
postura de isenção sobre o mérito da decisão, ("os juízes que decidam o
que for correto na opinião deles") Gianetti alerta para o risco de se
perder "a melhor oportunidade de mudança em anos num mar de discussões".
Em sua opinião, uma campanha com Lula "será rancorosa, envenenada." A
situação será diferente, contudo, caso ele seja impedido de concorrer.
"Seria bom para o eleitorado, nos daria oportunidade de fugir de uma
discussão burra e debater temas importantes."
É assim, com palavras que não disfarçam a arrogância de uma
classe que se coloca acima de outra ( "discussão burra") que se tenta
definir uma disputa com a presença de Lula. O uso de termos típicos de
psicanálise de manual ( campanha "rancorosa", eleitorado "vingativo")
serve para desqualificar o eleitorado adversário, que se tenta definir
como incapaz de encarar de forma racional "questões difíceis, como a
Previdência".
O que o assessor de Marina tenta evitar, com a exclusão de Lula, é
um debate civilizado e necessário, que só envolve "questões difíceis
como a Previdência" -- olha aí eleitor, cuidado! -- para candidatos que
pretendam prejudicar a maioria do eleitorado. A questão tem a ver
exclusivamente com a preservação das bases materiais de existência dos
brasileiros na velhice e, em muitos casos, consiste na fronteira entre a
vida decente e a miséria.
O caso do assessor de Marina, hoje uma concorrente apagadíssima em todas as pesquisas eleitorais, não é único.
Em editorial "A eterna vítima" (14/7/2017), o Estado de S. Paulo
não faz apelo "cívico" para o TRF-4 andar depressa. Lembra corretamente
que Justiça e Política obedecem ritmos e prazos diferentes, e que talvez
não seja possível retirar Lula da campanha com base numa decisão
judicial, ainda que isso seja conveniente a seus interesses políticos.
Mas o jornal já se mostra engajado, de qualquer maneira: " caso o tempo
da Justiça não seja o mesmo da política, que as urnas sejam tão
implacáveis quanto a sentença. Para o bem do Brasil e dos brasileiros."
De forma coerente, o Estado faz o possível para desqualificar as
críticas de Lula à condenação. Diz que não passam de "cantilena da
vitimização", típica de quem "não existe na esfera pública se não
estiver sendo vítima de alguma injustiça ou atacado pela força de uma
arbitrariedade. Jamais é o sujeito ativo de seus infortúnios".
Não haveria nada a estranhar se não fosse o jornal que mais
críticas tem feito a atuação do Ministério Público, em nome do Estado
Democrático de Direito. Em outro editorial, "É isto a
Justiça?"(1/6/2017) o Estado de S. Paulo acusava Sérgio Moro de exibir
"uma visão muito peculiar de justiça". A crítica a Moro se concentrava
justamente no uso de delações premiadas, recurso indispensável à
sentença contra Lula, transformada em farrapo jurídico quando a defesa
provou que o imóvel do Guarujá não poderia lhe pertencer após ter sido
empenhado -- em 2009 --num contrato com a Caixa Econômica.
Falando sobre o assunto, o jornal escreveu: "cria-se um ambiente em
que as delações parecem bastar. Se é assim, o objetivo não é fazer
justiça mas uma certa justiça. Aliás, o juiz Oliver W. Holmes (uma das referências da Suprema Corte dos Estados Unidos) ensinava que juiz não faz justiça, aplica a lei".
0 Comments:
Postar um comentário