Tomei conhecimento de que o vereador Edmilson Estevam propôs a realização de uma audiência pública, a fim de se discutir a criação de uma quota, reservada aos jardinenses, em concursos públicos realizados pela Administração Municipal.
Inicialmente, louvo a atitude do mencionado parlamentar. Sua proposta demonstra estar empenhado em defender os interesses dos cidadãos que aqui residem, facilitando a estes o acesso a cargos públicos municipais. Ninguém há de negar que o fato de morar na cidade, em tese, habilita o servidor a prestar um melhor serviço à população, na medida em que conhece mais de perto os problemas do município e as peculiaridades locais. Entretanto, salvo melhor juízo, a Constituição Federal veda esse tipo de cota em concurso público.
Nossa Carta Magna, em seu artigo 37, inciso II, determina que “a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração”. Tal exigência visa a selecionar as pessoas mais qualificadas para o serviço público, concedendo a todos iguais chances e ainda, na lição de Hely Lopes Meirelles, “afastando-se os ineptos e apaniguados que costumam abarrotar as repartições, num espetáculo degradante de protecionismo e falta de escrúpulos de políticos que se alçam e se mantém no poder leiloando cargos e empregos públicos” (In Direito Administrativo Brasileiro, pp. 403, 404).
O Supremo Tribunal Federal, através das súmulas 14 e 683, vedou a limitação de idade para inscrição em concurso público quando esta não for essencial ao eficaz desempenho da função. Uma pessoa de sessenta anos, por exemplo, não poderia prestar concurso para policial militar. Afora essa questão, nenhum edital de concurso público pode adotar critérios que restrinjam a livre concorrência, sob pena de sofrer questionamentos na área judicial.
Em defesa da proposta do vereador Edmilson, poder-se-iam citar a criação de quotas para negros e estudantes egressos de escolas públicas, nos exames vestibulares, e as vagas reservadas a portadores de deficiência, previstas no artigo 5º, § 2º, da Lei 8.112/90. Essas ações, no entanto, não guardam nenhuma relação com a proposta em análise.
As quotas para negros e estudantes egressos de escolas públicas só existem para lhes facilitar o acesso a universidades, não se prestando, pois, à contratação de servidores públicos. Já tramita no STF, inclusive, uma Ação Declaratória de Inconstitucionalidade em relação às quotas para negros.
No tocante à quota para deficientes físicos, trata-se de conferir a estes maiores chances de ingressarem no serviço público, tendo em vista que suas limitações físicas, geralmente, impedem-nos de competir em condições de igualdade com os demais candidatos.
Confesso que desconheço as razões nas quais se baseia o nobre parlamentar jardinense para justificar a aprovação de seu projeto de lei. Este humilde blogueiro não consegue imaginar um mísero argumento que fundamente a adoção de semelhante limitação. Caso seja mesmo aprovada pela Câmara Municipal e sancionada pelo prefeito, a lei já nasceria suscitando indagações de toda ordem:
1. Como aferir o preenchimento do critério de se morar em Jardim, tendo em vista a enorme dificuldade que já encontra a Justiça Eleitoral em impedir a inscrição de eleitores residentes em outros municípios?
2. A quota para jardinenses não iria diminuir a qualidade do serviço público, já que nossa população, por ser pequena, não conta com um número satisfatório de pessoas qualificadas para o exercício de determinadas funções?
3. A lei, por ser inconstitucional (na opinião deste humilde blogueiro), não criaria insegurança jurídica, pois, certamente, sofreria algum questionamento por parte do Ministério Público?
Existem outras ações capazes de tornar os jardinenses mais competitivos em concursos públicos promovidos pela Prefeitura Municipal, sem a necessidade de se criarem quotas para nos beneficiar. Bastaria, simplesmente, melhorar a qualidade da educação oferecida pelas escolas locais, facilitar o acesso de nossos estudantes a cursos em outras cidades (o ônibus escolar já não mais está dando conta da demanda) e instalar cursinhos preparatórios que funcionem permanentemente. Meus conterrâneos já demonstraram ser suficientemente inteligentes para disputar cargos públicos com qualquer pessoa que venha “de fora”. Eles só precisam que a cultura e a educação sejam mais valorizadas nesta querida terra.
Fonte: Alcimar Araújo
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