Da Rede Brasil Atual
- A derrubada do impeachment de Dilma Rousseff é o único caminho para a
saída dos golpistas do poder, o resgate do projeto aprovado e reeleito
por 54 milhões de votos, o restabelecimento da democracia, a
consolidação do estado democrático de direito e a garantia de que o povo
vai poder escolher o futuro que quer para o país. Uma nova eleição, em
meio ao avanço do golpe sobre os direitos, seria manipulada pelos
golpistas para a sua permanência no poder. Este é o consenso defendido
na noite desta terça-feira (10) no primeiro ato-debate oficial realizado
pelo Movimento pela Anulação do Impeachment.
O jurista e procurador da República Eugênio Aragão, que foi o último
ministro da Justiça do governo Dilma, dividiu a mesa de debate com o
jornalista e presidente do PCO, Rui Costa Pimenta, a enfermeira
aposentada e militante do PT Edva Aguilar, idealizadora das ventarolas
distribuídas durante os jogos olímpicos do Rio de Janeiro com a estampa
"Fora Temer", e a artista, compositora e ativista digital Malu Aires.
Na plateia que lotou o auditório da Apeoesp (o sindicato dos
professores da rede pública estadual), na Praça da República, região
central de São Paulo, representantes de movimentos de mulheres, de
moradia e da periferia da capital, do interior e de outros estados, além
de integrantes do PT e do PCO – que organizou o evento –, e dirigentes
do sindicato dos psicólogos, de professores e de sociólogos.
Participaram ainda representantes da União Paulista dos Estudantes
Secundaristas (Upes). A ex-ministra de Políticas para as Mulheres e
amiga pessoal de Dilma Eleonora Menicucci não pôde comparecer, mas
enviou mensagem na qual destaca que as duas agradecem e apoiam a
mobilização. Um nome conhecido presente foi o ex-deputado estadual
petista Adriano Diogo.
Entre as estratégias do movimento para viabilizar a volta de Dilma
estão a ampliação e intensificação de debates e a realização de grandes
atos e manifestações em várias cidades do país para dar mais peso às
pressões que alguns de seus militantes já vêm fazendo sobre o Supremo
Tribunal Federal e a Procuradoria-Geral da República, onde estão parados
processos que questionam o impeachment por não haver crime de
responsabilidade. Além disso, levar a questão para cortes internacionais
por meio de um pedido de liminar na Corte Interamericana de Direitos
Humanos, na Costa Rica.
Estão sendo criados comitês em diversas cidades pelo país e até no
exterior, os quais começam a agendar eventos. Nesta sexta-feira (13) à
noite, haverá debate na sede da CUT, em Brasília, e em Belo Horizonte, a
partir das 20h, no Restaurante do Ano, com a presença de Edva e Malu,
na chamada Sexta Valente. Entre os próximos dias 27 e 29, elas estarão
no 1º Encontro Internacional pela Democracia e Contra o Golpe em
Amsterdam, na Holanda, com ativistas brasileiros que moram na Europa.
É possível reverter o golpe?
Para Eugênio Aragão, é possível. "Se não tivéssemos condições de
enfrentar a Globo, o Sergio Moro, Rodrigo Janot, Gilmar Mendes, não
deveríamos estar aqui, e sim estar em casa, vendo novela", disse. "Mais
do que acreditar nisso, temos de ter fé de que é possível a partir de
uma consciência revolucionária. Não se trata de religião. Nossa fé é uma
fé ditada, que nasce de um processo histórico, e a gente sabe que as
coisas só mudam na luta. Não existe nada que é dado de graça."
Essa consciência revolucionária, segundo ele, é o caminho para uma
democracia alternativa à atual, moldada para impedir que os excluídos
cheguem ao poder. "Vivemos em uma sociedade escravocrata, pré-histórica
em muitos aspectos. Para chegarmos à democracia que queremos, temos de
restabelecer a que tínhamos. E para isso precisamos nos organizar e
modular o nosso discurso. A gente tem todas as condições na proporção de
força para assumir o poder que nunca assumimos", afirmou, ressaltando
que, no seu entender, a esquerda nunca esteve no poder, tampouco as
massas. "As massas que fazem a crítica ao movimento, que oxigenam o
movimento, nunca ditaram as políticas. Apenas tiveram parte nas suas
discussões."
Só a organização da sociedade, com participação das massas, pode
trazer resultados, conforme o ex-ministro. Ele não acredita que medidas
levadas às cortes internacionais possam surtir efeito. O Comitê de
Direitos humanos ao qual os advogados do ex-presidente Luiz Inácio Lula
da Silva recorreram contra os abusos na Operação Lava Jato é "apenas
mais um elemento, uma pedra no caminho da reação".
"Não podemos ter esperança porque o comitê não tem poderes
importantes. Faz um parecer sobre a situação e faz recomendações aos
governos. Se os governos não acatarem, o comitê nada pode fazer. No
máximo declarar que o governo esta descumprindo um tratado. Ponto. A
menos que esteja em jogo interesses estratégicos de grandes potências
centrais, o que não é o caso do Brasil."
Diferenciados os conceitos de inimigo e adversário, Eugênio Aragão
destacou que o governo Temer é inimigo. E que oposição cabe apenas
quando a democracia está em vigor, o que não acontece agora. "Quando a
democracia é derrotada, quem resiste é inimigo do golpe. Não temos de
ser oposição a Michel Temer porque ele assaltou o poder e se comportou
como inimigo, deve então ser tratado como inimigo."
Ele conclamou os movimentos sociais, que participaram, mas não
ditaram as políticas nos governos petistas, a relevarem as divergências
para a derrubada do golpe. "Volta de Dilma é imperativo, é a partir daí
que a gente volta a conversar, a definir o que queremos para revigorar a
democracia. Não podemos vacilar agora. Num duelo, quem vacila leva o
tiro."
Ele lembrou episódios da ditadura, como a ocasião em foi humilhado e
xingado por militares por não cantar o hino nacional quando se
apresentou para o serviço militar. "Não podemos permitir que esse estado
de coisas volte".
E destacou a diferença entre os setores progressistas e a ala
conservadora que teve participação nos governos petistas e que apoiaram o
golpe e agora participam de seu governo. "Somos como água e óleo. Temos
de nos voltar para as massas, das quais nunca deveríamos ter nos
afastado.
100% de chance
Rui Costa Pimenta também acredita na reversão do golpe. "Um movimento
formado pelas bases tem "100% de chances de prosperar", diz. Crítico
dos governos do PT principalmente pelas alianças com setores da direita,
pelo afastamento dos movimentos sociais e mais recentemente pela falta
de empenho das lideranças da legenda para conter a instalação e o avanço
do golpe, ele declara que não votou em Dilma – assim como todos do PCO,
segundo diz. No entanto, defende a volta da presidenta eleita para a
expulsão dos golpistas e o fim do avanço dos ataques à democracia e aos
direitos.
Para ele, o momento é propício porque, conforme acredita, o governo
golpista entrou em uma espiral da crise que aponta para o fracasso do
golpe. "Há diversos choques entre o governo, o congresso e o Judiciário,
em que a mídia golpista noticia que Temer tem o controle sobre o
legislativo. E há até colunistas conservadores já escrevendo sobre a
necessidade de o governo dar marcha à ré e fazer política igual à do PT
para evitar o colapso total. É a oportunidade para reverter o
impeachment. E se não fosse possível, este auditório não estaria lotado a
uma hora dessas, em início de janeiro. A chance de este movimento
formado pelas bases dos movimentos, sindicatos e partidos."
Na avaliação de Pimenta, a maior parte da esquerda não dimensionou a
real amplitude do impeachment. "É um típico golpe de estado que avança
rapidamente com medidas já aprovadas e outras em andamento para
modificar profundamente as relações existentes no país, principalmente
trabalhistas e sociais, que colocam em risco até mesmo a sobrevivência
da esquerda na legalidade. A depender do plano que minimiza os riscos
que o povo está correndo, a esquerda vai ficar à margem de um estado que
podem inclusive, vir a sofrer uma intervenção militar."
A grande questão, para ele, é a facilidade com que o impeachment foi
assimilado por políticos e pela maioria da esquerda. "Ninguém poderia
ter aceitado o golpe desse grupo conspirador. Não podemos recuar diante
do golpe que não se esgota com a retirada da presidenta eleita reeleita
com 54 milhões de votos mas que nos leva a todos a um beco sem saída. Se
não houver resistência, eles vão avançar e engolir tudo o que foi
conquistado com muita luta para derrubar a ditadura" .
Dúvidas
Edva Aguilar afirmou duvidar do apoio de Dilma a novas eleições e
criticou seu partido e a maioria da esquerda em dar o golpe como
consumado. "Grande parte das lideranças do PT e da esquerda não se
empenham na luta pela restituição do mandato de Dilma. Por que não unir
forças numa grande mobilização para anular o impeachment?", propõe.
A militante leu uma carta em que questiona a postura dos integrantes
do STF e do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, em relação às
ações que questionam o impeachment.
"As perícias do Senado inocentaram Dilma das supostas acusações de
crime de responsabilidade que a tiraram do cargo. Isso torna o
impeachment ilegal, ilegítimo e inconstitucional. Por isso os ministros
do STF, que são partícipes do golpe, devem acatar a ação que pede o
cancelamento do impeachment que é um golpe contra o voto popular, que dá
um ponta pé na democracia e um sinal verde ao golpismo. Anular é
importante para a democracia porque não há garantias de um processo
eleitoral isento e livre."
Processo xexelento
Uma das autoras de Crônicas da Resistência 2016 – Narrativas de uma
Democracia Ameaçada, Malu Aires acredita que as pessoas estão finalmente
despertando para uma nova realidade. "Parece que estão começando a
perceber a mesma coisa, que parece não haver mais leis, ou que as leis
não são nossas, e que os brasileiros não têm mais direito a nada.", diz.
A ativista não cogita a possibilidade de eleições. "Não vai haver
2018 porque a democracia acabou em 2014. Se a Dilma voltar, se esse
processo xexelento for anulado, com um país desse tamanho, muito maior
que o Congresso e o STF, nós vamos fazer o que deveríamos ter feito
desde o começo: governar junto com ela".
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